- setembro 14, 2020
- Dr. Alfredo Rizzo
- Direito Trabalhista
É voz corrente entre muitos empresários que a Justiça do Trabalho é paternalista e tende a “favorecer” os empregados.
É verdade que muitas pessoas (juízes, advogados, empresários etc.) com mais de 50 anos se lembrarão que no século passado existiam as chamadas “Juntas de Conciliação e Julgamento”, compostas pelos juízes trabalhistas e pelos chamados “juízes classistas”.
Naquele formato do Judiciário Trabalhista, sim, podemos dizer que diversos juízes classistas pressionavam as partes para fazer acordos e encerrar a reclamatória sem discutir o mérito da causa.
E empresários “assustados” com causas com valores absurdos optavam por fechar acordos para não correr o risco de uma condenação despropositada.
Atualmente, a afirmação feita no primeiro parágrafo desse artigo é completamente equivocada. A norma trabalhista é objetiva e vem sendo aplicada com absoluta imparcialidade dos julgadores.
Se a norma trabalhista é justa ou injusta, trata-se de questão estranha ao Poder Judiciário, devendo esse debate ser travado no âmbito do Poder Legislativo.
Mas, então, por que vários empresários continuam usando o discurso do protecionismo quando suas empresas perdem causas trabalhistas consideradas “ganhas”?
Por que simplesmente apresentar a documentação do empregado no processo não é garantia absoluta para alcançar o resultado esperado?
Tabela de Conteúdo
Cuidado e precaução
A resposta é simples: porque muitas vezes falta cuidado e precaução ao empresário no trato de seus empregados, cometendo falhas na aplicação da norma trabalhista que futuramente lhe trará prejuízo. Algumas dessas falhas são cometidas até por desconhecimento correto do comando legal.
Portanto, a primeira recomendação é que toda a documentação relativa ao empregado seja tratada com rigor extremo.
Os recibos de salário devem ser completos (ou seja, contemplando as verbas salariais pagas e os descontos) e assinados pelo empregado na data do pagamento.
Pagar parte do salário “por fora”, mesmo a pedido do empregado ou sendo combinado com ele, é considerada prática ilegal.
Os cartões de ponto devem ser assinados pelo empregado e refletir a jornada efetivamente cumprida.
Ajustar com o empregado que ele marcará o horário de saída, mas voltará a trabalhar para receber as horas extras “por fora”, é prática ilegal e que apenas trará prejuízo ao empregador (eventual ajuste com o empregado nesse sentido não tem valor jurídico, pois prevalece a aplicação da lei).
Os cartões de ponto com o chamado “horário britânico” (horário de entrada, intervalo e saída sempre iguais todos os dias, ou seja, sem variação; por exemplo: 8:00h – 12:00h-13:00h – 18:00h) não tem valor jurídico, pois é impossível que um empregado chegue ao trabalho exatamente às 8:00h todos os dias do mês. As pequenas variações de minutos devem constar dos cartões de ponto para lhe conferir credibilidade.
Os equipamentos de proteção individual devem atender a sua finalidade (preservar a saúde do empregado), sua utilização deve ser fiscalizada (não basta apenas entregar o equipamento e contar com o discernimento do empregado) e a sua troca deve ocorrer conforme a validade de cada equipamento.
Se o empregado se recusar a usar o equipamento, ou tirar o equipamento sem autorização durante suas atividades, ele deverá ser advertido, suspenso e demitido por justa causa se insistir nesse comportamento.
As férias devem ser usufruídas pelo empregado. Se o empregado optar por vender parte de suas férias, deve ser observado o limite legal. Mesmo que o empregado alegue que “precisa mais do dinheiro do que de descanso”, que ele “não aguenta ficar em casa sem fazer nada”, que “gostaria de pagar uma dívida com o valor das férias”, o empregador deve respeitar a lei.
Qualquer acordo “informal” feito com o empregado (mesmo aquele que tem muitos anos na empresa e que é de “absoluta confiança”) não tem valor jurídico.
Exemplos não faltam de documentos incompletos ou errados e de situações de desrespeito à norma trabalhista.
Agindo o empresário com estrita observância da lei e mantendo a documentação do empregado em ordem, suas chances de êxito numa disputa judicial com o empregado serão maiores.
Demissão sem justa causa
Demissão sem justa causa é a demissão imotivada.
O empregador pretende diminuir seu custo com a folha salarial, pode não estar satisfeito com o desempenho do empregado, pode querer trocar o empregado por outro etc.
Juridicamente, o empregador não tem a obrigação de explicar ao empregado o motivo da demissão. A obrigação da empresa é pagar os direitos trabalhistas devidos na rescisão contratual.
Demissão com justa causa
Ao contrário da demissão sem justa causa, na demissão por justa causa o empregador precisa explicar ao empregado o motivo da rescisão do contrato de trabalho.
E essa explicação é necessária porque na demissão por justa causa alguns direitos trabalhistas do empregado não serão pagos (multa de 40% do FGTS, aviso prévio etc).
A lei estabelece quais são os motivos cabíveis para a aplicação da justa causa (artigo 482 da CLT).
Do ponto de vista jurídico, é fundamental que o empregador reúna as provas para demonstrar em Juízo (se o empregado questionar em Juízo a inexistência do motivo) que a justa causa aplicada tem fundamento (um documento, uma filmagem, uma gravação, o depoimento confiável de testemunhas etc.).
Dispensa no período de estabilidade
O que é período de estabilidade?
É o período em que o empregado não pode ser demitido (exceto na hipótese de justa causa), pois ele está “protegido” da demissão por um motivo legal.
Os casos mais frequentes são da gestante, empregado que sofre acidente de trabalho (desde que o afastamento seja superior a 15 dias) e empregado eleito para ocupar a CIPA.
Nesses casos, o empregador tem a obrigação de manter em seus quadros o empregado pelos respectivos períodos previstos em lei.
Quais são esses períodos e qual seu marco inicial?
(i) Gestante: 5 meses, contados do parto;
(ii) Acidente de Trabalho: 12 meses, contados da cessação do auxílio-doença acidentário; e
(iii) CIPA: 2 anos, sendo 12 meses durante o exercício do seu mandato e 12 meses após o término do mandato.
Importante frisar que há situações que permitem que a empresa e o empregado rescindam o contrato de trabalho, de comum acordo, desde que o empregado seja indenizado pelo período da estabilidade que faz jus.
Importante destacar, também, que o empregado que voluntariamente pede demissão durante o gozo da estabilidade não terá direito de receber pelo período remanescente.
Um alerta se faz necessário, nesse caso: o empregador deve tomar todas as cautelas para que esse pedido de demissão seja considerado válido.
Não basta um documento escrito de próprio punho e assinado pelo empregado: a demissão deve ser homologada perante o Sindicato da categoria, para assegurar numa eventual reclamação trabalhista que o empregado manifestou sua vontade livremente e foi orientado de seus direitos e garantias pelo órgão de classe.
Demissão de funcionário que esteja em tratamento médico
Muitos artigos escritos sobre o tema pretendem estabelecer regras rígidas sobre dúvidas jurídicas e o Direito, especialmente o Direito do Trabalho, muitas vezes contempla uma zona cinzenta que depende das peculiaridades do caso concreto para se chegar a uma resposta satisfatória.
A visão do legislador, corroborada pelo Poder Judiciário, é de que o trabalho é fundamental para garantir a dignidade humana, pois é da atividade laboral que a esmagadora maioria das pessoas retira seu sustento.
A relação entre empregador e empregado é de simbiose. Há benefício para ambas as partes: a empresa utiliza o trabalho do empregado para subsistir e ter lucro e o empregado oferece sua mão de obra para a empresa em troca de sua remuneração.
A relação equilibrada é que sustenta ambos. O empregado que não trabalha corretamente se transforma num peso para a empresa e a empresa que não paga corretamente acaba por explorar a mão de obra do empregado indevidamente.
O empregado, porém, está sujeito aos percalços da vida e um deles é de ser acometido de uma doença.
E nesse momento, a empresa não pode (moral e juridicamente) dar as costas para ele, pois é nessa fase que o empregado mais necessita do seu salário.
Portanto, a demissão do empregado em tratamento médico, como regra, é ilegal.
Mas não é todo tratamento médico que justifica a estabilidade do empregado.
Se o empregado tem condições de trabalhar normalmente (o exame médico o qualifica como apto para o trabalho), nada impede que o empregador exerça sua prerrogativa de demiti-lo.
O Direito não contempla uma estabilidade eterna entre a empresa e o empregado, como ocorria há tempos atrás com a chamada “estabilidade decenal” (que não encontra mais previsão legal).